sábado, março 31, 2007
Toda a música é minha
Entre os teus lábios
é que a loucura acode,
desce à garganta,
invade a água.
No teu peito
é que o pólen do fogo
se junta à nascente,
alastra na sombra.
Nos teus flancos
é que a fonte começa
a ser rio de abelhas,
rumor de tigre.
Da cintura aos joelhos
é que a areia queima,
o sol é secreto,
cego o silêncio.
Deita-te comigo.
Ilumina meus vidros.
Entre lábios e lábios
toda a música é minha.
Eugénio de Andrade
pindaro
sexta-feira, março 30, 2007
A recreação dos sentidos
... e, depois de recolhidos, gastaram em o desejo da (noite) que se seguia o mesmo espaço que daquela poupavam; que muitas vezes a recreação dos sentidos vence a necessidade do repouso que os suspende.
Francisco Roíz Lobo
Pindaro
O crescendo da alma
We are all mortal until the first kiss and the second glass of wine.
Eduardo Galeano
pindaro
O acordo misterioso
Joseph Kessel
pindaro
Metade da minha alma
Mar, metade da minha alma é feita de maresia
Pois é pela mesma inquietação e nostalgia,
Que há no vasto clamor da maré cheia,
Que nunca nenhum bem me satisfez.
E é porque as tuas ondas desfeitas pela areia
Mais fortes se levantam outra vez,
Que após cada queda caminho para a vida,
Por uma nova ilusão entontecida.
Sophia de Mello Breyner
pindaro
Puríssimo
Fremente de espumas.
Corpos ou ondas:
iam, vinham, iam,
dóceis, leves,
só alma e brancura.
Felizes, cantam;
serenos, dormem;
despertos, amam,
exaltam o silêncio.
Tudo era claro,
jovem, alado.
O mar estava perto
puríssimo, doirado.
Eugénio de Andrade
pindaro
Outra ciência
Qualquer um sabe proferir palavras enganadoras;
as mentiras do corpo exigem outra ciência.
François Mauriac
pindaro
E sei que um dia será
e me tomando devagar,
como o mar avança na praia,
como eu sei que tem que ser
e sei que um dia será.
Claudia Mrczac
pindaro
A pureza do acaso
O acaso é o grande mestre de todas as coisas. A necessidade só vem depois, não tem a mesma pureza.
Luis Buñuel
Pindaro
Nos seus olhos
Crispado como um excêntrico, eu bebia então
nos seus olhos, céu plúmbeo onde nasce o tufão,
a doçura que encanta e o prazer que mata.
Beaudelaire
quinta-feira, março 29, 2007
La mar
La mar es
el Lucifer de la luz.
Cuanda mala mujer
la mar es cruz.
El cielo caído
por querer ser su luz.
versão de Jorge Luis Borges
do poema Mar de Federico Garcia Lorca
Pindaro
É o silêncio...
E se alguma coisa me agrada em ti é o silêncio que guardam os teus silêncios, tão semelhantes aos das tuas fotografias frias e perfeitas.
Arturo Perez-Reverte
pindaro
Un certain art
Pour ma part, je reivindique hautement le privilège d´avoir connu, senti et aimé la fine fleur d´un certain art d´exister au- dela des frontières du raisonnable.
Doutor Lívio
A cercadura do relance
La précision des équivoques est l'un des charmes du style.
Roger Judrin
pindaro
Ângulos e arestas
Le succès, au lieu d'apporter la liberté, finit par devenir un style de vie.
Arthur Miller
Pindaro
A graça é imerecida
Eu sou do tempo em que a mulher
Mostrar o tornozelo
Era um apelo!
Depois, já rapazinho, vi as primeiras pernas
De mulher
Sem saia;
Mas foi na praia!
A moda avança
A saia sobe mais
Mostra os joelhos
Infernais!
As fazendas
Com os anos
Se fazem mais leves
E surgem figurinhas
Em roupas transparentes
Pelas ruas:
Quase nuas.
E a mania do esporte
Trouxe o short.
O short amigo
Que trouxe consigo
O maiô de duas peças.
E logo, de audácia em audácia,
A natureza ganhando terreno
Sugeriu o biquíni,
O maiô de pequeno ficando mais pequeno
Não se sabendo mais
Até onde um corpo branco
Pode ficar moreno.
Deus,
A graça é imerecida,
Mas dai-me ainda
Uns aninhos de vida!
Millor Fernandes
pindaro
Amor sem rede
Fecho os olhos e consigo
lembrar o que fiz contigo:
foi AMOR como não há!...
Mas no meio desta insónia
nua e sem cerimónia
acaricio-me já...
Mas falta-me a tua mão
os teus lábios, o escaldão
da tua língua macia...
Percorre-me com teu tacto,
põe-me de gatas no acto
que mais libera a magia!
Corre para a minha beira!
Lavra-me! Eu sou a leira
que ressequida reclama...
Vem e faz-me amor sem rede,
Vem e mata minha sede,
à rédea solta, na cama!
Teresa Machado
pindaro
quarta-feira, março 28, 2007
Fermoso Tejo
Fermoso Tejo meu, quão diferente
Te vejo e vi, me vês agora e viste:
Turvo te vejo a ti, tu a mim triste,
Claro te vi eu já, tu a mim contente.
A ti foi-te trocando a grossa enchente
A quem teu largo campo não resiste;
A mim trocou-me a vista em que consiste
O meu viver contente ou descontente!
Já que somos no mal participantes,
Sejamo-lo no bem. Oh, quem me dera
Que fôramos em tudo semelhantes!
Mas lá virá a fresca Primavera:
Tu tornarás a ser quem eras dantes,
Eu não sei se serei quem dantes era.
francisco roíz lobo
Pindaro
Las desengaña
El torerísimo d. juan no engaña a las mujeres;
al contrario, las desenganã.
El toreo no engaña, desengaña el toro
josé bergamín
pindaro
La tesitura
Entre el amor, la noche, el sueño,
la realidad, el deseo;
la pasión y la ternura
está la tesitura.
Ylia Kazama
pindaro
Spleen
Le verbe aimer est l´un des plus difficiles
à conjuguer;
Son passé n´est pas simple,
son présent n´est qu´indicatif
et son futur
est toujours conditionnel
Jean Cocteau
pindaro
O estremecimento do ramo
«Os grandes defeitos são tão profundos que uma pessoa não vê nada à superfície excepto o sorriso.
E as grandes experiências definitivas só sucedem uma vez, infelizmente!
Sim, só tens direito a uma dentada na cereja.
A longa noite aproxima-se, e a treva é explícita.
Bebe como os tigres bebem, furtivamente.
(...)
Uma ideia é como uma ave rara que não pode ser vista.
O que uma pessoa vê é o estremecimento do ramo de onde ela acaba de levantar voo.»
Lawrence Durrel
pindaro
É esse o papel
Orfeu: Mas, enfim, Senhora ... explicar-me-á?
A princesa: Nada. Se dorme, se sonha,
aceite os seus sonhos. É esse o papel do sonhador.
(guião de Jean Cocteau
para o filme Orphée)
pindaro
terça-feira, março 27, 2007
Comprimentos e pontas
Simulando deixar-se conduzir, nunca ia além do limite onde queria ser levado. Quanto mais observava mais ia duvidando.
Honoré de Balzac
pindaro
Para todos os lados
A solidez da terra seca, monótona,
parece-nos fraca ilusão.
Queremos a solidão do grande mar,
multiplicada em suas malhas de perigo.
Queremos sua solidão robusta,
uma solidão para todos os lados, uma ausência humana que se opõe ao mesquinho formigar do mundo.
Cecília Meireles
pindaro
Logo a mim
Pois logo a mim, tão cheia de garras e sonhos, coubera arrancar de seu coração a flecha farpada.
Clarice Lispector
pindaro
L´esprit
Il considérait la femme comme un objet d'art, délicieux et propre à exciter l'esprit.
Charles Baudelaire
pindaro
Floresta sem atalhos
Não deve causar estranheza que cálculos rigorosos, de ordem histórica e literária, tendentes a dar a uma personagem imaginária o máximo da plausibilidade a levem a embater como por acaso numa personagem real. Continuo a espantar-me com a quantidade e a intensidade das movimentações obscuras que nos orientam para um nome, um facto, uma personagem e não para outro. Entramos aí na floresta sem atalhos.
Marguerite Yourcenar
pindaro
Amar e malamar
Que pode uma criatura senão,
entre outras criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Carlos Drummond de Andrade
Pindaro
O supérfluo
segunda-feira, março 26, 2007
domingo, março 25, 2007
Rapacidade e quieteza
A mulher não é um predador, pelo contrário, é a presa que faz uma emboscada ao seu predador.
Ortega y Gasset
pindaro
La recordaba
Noches hubo en que me creí tan seguro de poder olvidarla que voluntariamente la recordaba.
Jorge Luis Borges
Pindaro
Fe mía
No me fío de la rosa
de papel,
tantas veces que la hice
yo con mis manos.
Ni me fío de la otra
rosa verdadera,
hija del sol y sazón,
la prometida del viento.
De ti que nunca te hice,
de ti que nunca te hicieron,
de ti me fío, redondo
seguro azar.
Pedro Salinas
pindaro
Si no es el mar
Si no es el mar, sí es su imagen,
su estampa, vuelta, en el cielo.
Si no es el mar, sí es su voz
delgada,
a través del ancho mundo,
en altavoz, por los aires.
Si no es el mar, sí es su nombre
es un idioma sin labios,
sin pueblo,
sin más palabra que ésta:
mar.
Si no es el mar, sí es su idea
de fuego, insondable, limpia;
y yo,
ardiendo, ahogándome en ella.
Pedro Salinas
pindaro
Mar sólo
En ti estás todo, mar, y sin embargo,
qué sin ti estás, qué solo,
qué lejos, siempre, de ti mismo!
Abierto en mil heridas, cada instante,
cual mi frente,
tus olas van, como mis pensamientos,
y vienen, van y vienen,
besándose, apartándose,
en un eterno conocerse,
mar, y desconocerse.
Eres tú, y no lo sabes,
tu corazón te late y no lo siente...
Qué plenitud de soledad, mar sólo!
Juan Ramón Jiménez
pindaro
Este silencio
Este silencio,
blanco, ilimitado,
este silencio
del mar tranquilo, inmóvil,
que de pronto
rompen los leves caracoles
por un impulso de la brisa,
Se extiende acaso
de la tarde a la noche, se remansa
tal vez por la arenilla
de fuego,
la infinita
playa desierta,
de manera
que no acaba,
quizás,
este silencio,
nunca?
Eliseo Diego
pindaro
Do silêncio musical
Na sombra cúmplice do quarto,
Ao contacto das minhas mãos lentas
A substância da tua carne
Era a mesma que a do silêncio.
Do silêncio musical, cheio
De sentido místico e grave,
Ferindo a alma de um enleio
Mortalmente agudo e suave.
Ah, tão suave e tão agudo!
Parecia que a morte vinha…
Era o silêncio que diz tudo
O que a intuição mal advinha.
É o silêncio da tua carne.
da tua carne de âmbar, nua,
Quase a espiritualizar-se
Na aspiração de mais ternura.
Manuel Bandeira
Pindaro
sábado, março 24, 2007
Ilha de amor
Maravilha
Ilha de luz
Quero tua cor mulata
A tua verde mata
Os teus mares azuis
Maravilha
Também quero o teu bagaço
A força do teu braço
O afago dos teus calos
Quero teus regalos
Encharcados de suor
Antilha
Ilha de amor
Jura que a felicidade
É mais que uma vontade
É mais que uma quimera
Ai, eu quero uma lembrança
Eu quero uma esperança
A tua primavera
Ai, eu quero um teu pedaço
Entorna o teu melaço
Sobre a minha terra
Chico Buarque
pindaro
Palavras nuas
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.
(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
Alexandre O´Neill
pindaro
sexta-feira, março 23, 2007
El crimen fue en Granada
I
EL CRIMEN
Se le vio, caminando entre fusiles,
por una calle larga,
salir al campo frío,
aún con estrellas, de la madrugada.
Mataron a Federico
cuando la luz asomaba.
El pelotón de verdugos
no osó mirarle la cara.
Todos cerraron los ojos;
rezaron: !ni Dios te salva!
Muerto cayó Federico
- sangre en la frente y plomo en las entraña -
...Que fue en Granada el crimen
sabed -!pobre Granada! -, en su Granada...
II
EL POETA Y LA MUERTE
Se le vio caminar solo con Ella,
sin miedo a sua guadaña.
- Ya el sol en torre y torre; los martillos
en yunque-yunque y yunque de las fraguas.
Hablaba Federico
requebrando a la muerte. Ella escuchaba.
"Porque ayer en mi verso, compañera,
sonaba el golpe de tus secas palmas,
y diste el hielo a mi cantar, y el filo
a mi tragedia de tu hoz de plata,
te cantaré la carne que no tienes,
los ojos que te faltan,
tus cabellos que el viento sacudía,
los rojos labios donde te besaban...
Hoy como ayer, gitana, muerte mía,
qué bien contigo a solas,
por estes aires de Granada, !mi Granada!"
III
Se le vio caminar...
Labrad, amigos,
de piedra Y sueño, en la Alhambra,
un túmulo al poeta,
sobre una fuente donde llore el agua,
Y eternamente diga:
el crimen fue en Granada, !en sua Granada!
El sediento
Por buscarme, Poesía, en ti me busqué:
deshecha estrella de agua,
se anegó en mi ser.
Por buscarte, Poesía,
en mí naufragué.
Después sólo te buscaba
por huir de mí:
espesura de reflejos
en que me perdí!
Mas luego de tanta vuelta
otra vez me vi:
el mismo rostro anegado
en la misma desnudez;
las mismas aguas de espejo
en las que no he de beber;
y en el borde del espejo,
el mismo muerto de sed.
Octavio Paz
pindaro
quinta-feira, março 22, 2007
Como una flecha en mi arco
Cuerpo de mujer, blancas colinas, muslos blancos,
te pareces al mundo en tu actitud de entrega.
Mi cuerpo de labriego salvaje te socava
y hace saltar el hijo del fondo de la tierra.
Fui solo como un túnel. De mí huían los pájaros
y en mí la noche entraba su invasión poderosa.
Para sobrevivirme te forjé como un arma,
como una flecha en mi arco, como una piedra en mi honda.
Pero cae la hora de la venganza, y te amo.
Cuerpo de piel, de musgo, de leche ávida y firme.
Ah los vasos del pecho! ¡Ah los ojos de ausencia!
Ah las rosas del pubis! ¡Ah tu voz lenta y triste!
Cuerpo de mujer mía, persistiré en tu gracia.
Mi sed, mi ansia si límite, mi camino indeciso!
Oscuros cauces donde la sed eterna sigue,
y la fatiga sigue, y el dolor infinito.
Pablo Neruda
Pindaro