domingo, fevereiro 28, 2010

Sorrisos de esquecer






























No teu olhar eu leio
Um lúbrico vagar.
Dorme no sonho de existir
E na ilusão de amar.

Tudo é nada, e tudo
Um sonho finge ser.
O espaço negro é mudo.
Dorme, e, ao adormecer,
Saibas do coração sorrir
Sorrisos de esquecer.
Dorme sobre o meu seio,
Sem mágoa nem amor...

No teu olhar eu leio
O íntimo torpor
De quem conhece o nada-ser
De vida e gozo e dor.


Fernando Pessoa

pindaro

Lembranças com futuro



























A quoi penses-tu ?
Je pense au premier baiser que je te donnerai.

Paul Éluard

pindaro

Les prestiges de l'esprit.























L'érotisme, c'est de donner au corps les prestiges de l'esprit.
Georges Perros

pindaro

De atrevido é venturoso





























Crecei, desejo meu, pois que a Ventura
já vos tem nos seus braços levantado;
que a bela causa de que sois gerado
o mais ditoso fim vos assegura.

Se aspirais por ousado a tanta altura,
não vos espante haver ao Sol chegado;
porque é de águia real vosso cuidado,
que, quanto mais o sofre, mais se apura.

Ânimo, coração! que o pensamento
te pode inda fazer mais glorioso,
sem que respeite a teu merecimento.

Que cresças inda mais é já forçoso,
porque, se foi de ousado o teu intento,
agora de atrevido é venturoso.

Luis Vaz de Camões

pindaro

sábado, fevereiro 27, 2010

Um efeito sedutor




























Não seduz, deseja, e esse desejo tem um efeito sedutor.
S. Kierkgaard

pindaro

La possibilité d'un geste




























L'érotisme réside dans la possibilité d'un geste. Il appartient au domaine du rêve.
Jean-François Somain

pindaro

sexta-feira, fevereiro 26, 2010

Coisas da Natureza




























Parecia que a tarde se punha mais morena
Frederico Garcia Lorca

pindaro

Perto de coisas e pessoas








Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui
para a frente do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas.
As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam
poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram,
cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir
assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar
da idade cronológica, são imaturos.
Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo
de secretário geral do coral.

'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência,
minha alma tem pressa...
Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana,
muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com
triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade,
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial!

Mario de Andrade


pindaro

Those sweet excesses that I do adore




















Beloved,
In what other lives or lands
Have I known your lips
Your Hands
Your Laughter brave
Irreverent.
Those sweet excesses that
I do adore.
What surety is there
That we will meet again,
On other worlds some
Future time undated.
I defy my body's haste.
Without the promise
Of one more sweet encounter
I will not deign to die.


Maya Angelou

Pindaro

Aux pays des amours





























Dites, la jeune belle,
Où voulez-vous aller ?
La voile [ouvre] son aile,
La brise va souffler !

L'aviron est d'ivoire,
Le pavillon de moire,
Le gouvernail d'or fin ;
J'ai pour lest une orange,
Pour voile une aile d'ange,
Pour mousse un séraphin.

Dites, la jeune belle !
Où voulez-vous aller?
La voile [ouvre] son aile,
La brise va souffler !

Est-ce dans la Baltique,
[Sur] la mer Pacifique,
Dans l'île de Java ?
Ou bien [dans la] Norwége,
Cueillir la fleur de neige,
Ou la fleur d'Angsoka ?

Dites, la jeune belle,
Où voulez-vous aller?
[La voile ouvre son aile,
La brise va souffler!]

- Menez-moi, dit la belle,
À la rive fidèle
Où l'on aime toujours.
- Cette rive, ma chère,
On ne la connaît guère
Au pays des amours.


Théophile Gautier

pindaro

quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Rituais do Indecifrável
























We are by nature observers, and thereby learners. That is our permanent state.
Ralph Waldo Emerson

pindaro

A hidden truth



























When a thing is funny, search it carefully for a hidden truth.

George Bernard Shaw

pindaro

Mapa de viagens




























É fazendo que se aprende a fazer aquilo que se deve aprender a fazer
Aristóteles

pindaro

Simples e claro





























Tudo o que é verdadeiramente sábio é simples e claro
Maximo Gorky

pindaro

Cumprimentos e pontas





















Cumpre em relação aos outros aquilo que só a ti proprio prometeste
René Char

pindaro

quarta-feira, fevereiro 24, 2010

All losses are restored







When to the sessions of sweet silent thought
I summon up remembrance of things past,
I sigh the lack of many a thing I sought,
And with old woes new wail my dear time's waste:
Then can I drown an eye, unused to flow,
For precious friends hid in death's dateless night,
And weep afresh love's long since cancell'd woe,
And moan the expense of many a vanish'd sight:
Then can I grieve at grievances foregone,
And heavily from woe to woe tell o'er
The sad account of fore-bemoaned moan,
Which I new pay as if not paid before.
But if the while I think on thee, dear friend,
All losses are restored and sorrows end.

William Shakespeare

pindaro

Ce coeur immortel




























Je t'aime pour ta sagesse qui n'est pas la mienne
Pour la santé
Je t'aime contre tout ce qui n'est qu'illusion
Pour ce coeur immortel que je ne détiens pas
Tu crois être le doute et tu n'es que raison
Tu es le grand soleil qui me monte à la tête
Quand je suis sûr de moi

Paul Éluard

pindaro

terça-feira, fevereiro 23, 2010

Falta saber, engenho e arte




























Eu cantarei de amor tão docemente,
Por uns termos em si tão concertados,
Que dous mil acidentes namorados
Faça sentir ao peito que não sente.

Farei que o amor a todos avivente,
Pintando mil segredos delicados,
Brandas iras, suspiros magoados,
Temerosa ousadia e pena ausente.

Também, Senhora, do desprezo honesto
De vossa vista branda e rigorosa,
Contentar-me-ei dizendo a menor parte.

Porém, para cantar de vosso gesto
A composição alta e milagrosa,
Aqui falta saber, engenho e arte.


Luís de Camões

pindaro

Amor à linha



























No ar nocturno da paisagem, a estranheza da alma despida do seu vulto.
Cartas de amor, letra a letra, para o espirito do lugar, para o desassossego da saudade.
Apanhar amores perdidos como se apanham os peixes.
Preciso é fio de pesca.

D. Júlio

segunda-feira, fevereiro 22, 2010

À flor da vaga



















Nas róseas ondas quando o amanhecer
Carmina a areia, entre rochas altas
Banham-se as belas. Vem amigo ver,
Flutuar meu cabelo à flor das águas.

Ó vem,sedento ! Amigo,vem beber
A água que do cabelo me escorrer.

No mar que à areia nácar vem render,
Entre altas rochas, raiando a madrugada,
Banham-se as belas. Vem amigo ver
Meus ombros flutuar à flor da vaga.
ó vem sedento!Amigo,vem beber
A água que dos ombros me escorrer.

Na vaga que de brilho a areia asperge
Entre altas rochas, quando a manhã desponta
Banham-se as belas. Vem amigo ver
Meu seio flutuar à flor da onda.
Ó vem, sedento!Amigo,vem beber
A água que do seio me escorrer.

Natália Correia

pindaro

Dos amores que têm vida























Amar! mas dum amor que tenha vida...
Não sejam sempre tímidos arpejos,
Não sejam só delírios e desejos
Duma doida cabeça escandecida...

Amor que viva e brilhe! luz fundida
Que penetre o meu ser - e não só beijos
Dados no ar -delírios e desejos -
Mas amor...dos amores que têm vida...

Sim, vivo e quente! e já a luz do dia
Não virá dissipá-lo nos meus braços
Como névoa da vaga fantasia...

Nem murchará do Sol à chama erguida...
Pois que podem os astros dos espaços
Contra uns débeis amores...se têm vida ?


Antero de Quental

pindaro

domingo, fevereiro 21, 2010

Foi ela ou o meu dizer?























Um pouco de sol
Num nada de sal
Virgem na praia.
Azul seu raio a medo o olhar criou.
Tão redonda na onda arfa uma saia?
Foi ela ou o meu dizer que se afogou?


Vitorino Nemésio

Pindaro

Se uma fada me quisesse a mim fadar...





















As fadas... eu acredito nelas!
Umas são moças e belas,
Outras velhas de pasmar...
Umas vivem nos rochedos
Outras pelos arvoredos,
Outras, à beira do mar...

Umas têm mando nos ares;
Outras, na terra, nos mares;
E todas trazem na mão
Aquela vara formosa,
A vara maravilhosa,
A varinha de condão.

Quantas vezes, já deitado,
Mas sem sono, inda acordado,
Me ponho a considerar.
Que condão eu pediria,
Se uma fada, um belo dia,
Me quisesse a mim fadar...

Antero de Quental

pindaro

sábado, fevereiro 20, 2010

Reflecte e recria




























Em teu macio olhar repousa o meu
E na face polida, assim formada
se reflecte e recria o próprio céu

Daniel Filipe

pindaro

sexta-feira, fevereiro 19, 2010

Linhas e signos






Il faut être pessimiste en ce qui concerne la condition humaine, mais optimiste en ce qui concerne l'homme .

Albert Camus

pindaro

quinta-feira, fevereiro 18, 2010

Sabe bem olhar p´ra ela








O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pr'a saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...


Fernando Pessoa

pindaro

Tous les jours






Je vais vous dire un grand secret... N'attendez pas le Jugement dernier. Il a lieu tous les jours.
Albert Camus

pindaro

Souvent




























Il arrive souvent de ne rien obtenir parce que l'on ne tente rien.
Jacques Deval

pindaro

quarta-feira, fevereiro 17, 2010

Geometria do romance







Devíamos sempre aprender a amar-nos; é o único romance que dura a vida inteira
Gabreile D'Annunzio

pindaro

Comprimentos e pontas























Não faças planos para a vida, que podes estragar os planos que a vida tem para ti.
Agostinho da Silva

Pindaro

terça-feira, fevereiro 16, 2010

In a photograph




















Mallarme said that everything in the world exists in order to end in a book. Today everything exists to end in a photograph.
Susan Sontag

pindaro

Aspectos elementares






Que ideia a de que no Carnaval as pessoas se mascaram. No Carnaval desmascaram-se.
Vergilio Ferreira

pindaro

Into the futurity of the dream

























Carni vale – the flesh's farewell to the year, unwinding its mummy wrappings of sex, identity, and name, and stepping forward naked into the futurity of the dream.
Lawrence Durrel
pindaro

segunda-feira, fevereiro 15, 2010

L´Amour




























L'amour, c'est offrir à quelqu'un qui n'en veut pas quelque chose que l'on n'a pas.
Jacques Lacan

pindaro

Um outro







Por sobre o que Eu não sou há grandes pontes
Que um outro, só metade, quer passar
Em miragens de falsos horizontes -
Um outro que eu não posso acorrentar.


Mário de Sá-Carneiro
pindaro

domingo, fevereiro 14, 2010

Les mirages























Les mirages sont en quelque sorte le mensonge du désert
Jean Cocteau

pindaro

Palavras para te dizer






























Como quem procura conchas à beira do mar
escolho as palavras para te dizer,
quando o silêncio dos teus braços
vestir o frio dos meus ombros


Luisa Dacosta

pindaro

sábado, fevereiro 13, 2010

Como una flecha en mi arco






















Cuerpo de mujer, blancas colinas, muslos blancos,
te pareces al mundo en tu actitud de entrega.
Mi cuerpo de labriego salvaje te socava
y hace saltar el hijo del fondo de la tierra.

Fui solo como un túnel. De mí huían los pájaros
y en mí la noche entraba su invasión poderosa.
Para sobrevivirme te forjé como un arma,
como una flecha en mi arco, como una piedra en mi honda.

Pero cae la hora de la venganza, y te amo.
Cuerpo de piel, de musgo, de leche ávida y firme.
¡Ah los vasos del pecho! ¡Ah los ojos de ausencia!
¡Ah las rosas del pubis! ¡Ah tu voz lenta y triste!

Cuerpo de mujer mía, persistiré en tu gracia.
Mi sed, mi ansia si límite, mi camino indeciso!
Oscuros cauces donde la sed eterna sigue,
y la fatiga sigue, y el dolor infinito.

Pablo Neruda

Pindaro

O seu corpo é um barco

























Sempre a tentativa nunca vã…
O equilíbrio musical dos instrumentos,
a paciência do teu pulso suave e certo,
o teu rosto mais largo e a calma força
que sobe e que modelas palmo a palmo,
rio que ascende como um tronco em plena sala.
A tua casa habita entre o silêncio e o dia.
Entre a alma e a luz o movimento é livre.
Acordar a leve chama veia a veia,
erguê-la do fundo e solta propagá-la
aos membros e ao ventre, até ao peito e às mãos
e que a cabeça ascenda, cordial corola plena.
Todo o corpo é uma onda, uma coluna flexível.
Respiras lentamente. A terra inteira é viva.
E sentes o teu sangue harmonioso e livre
correr ligado à água, ao ar, ao fogo lúcido.
No interior centro cálido abre-se a flor da luz,
rigor suave e óleo, música de músculos, roda
lenta girando das ancas ao busto ondeado
e cada vez mais ampla a onda livre ondula
a todo o corpo uno, num respirar de vela.
Sobre a toalha de água, à luz de um sol real,
dança e respira, respira e dança a vida,
o seu corpo é um barco que o próprio mar modela.


António Ramos Rosa

pindaro

Em todas as ruas




























Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto, tão perto, tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco.

Mário Cesariny de Vasconcelos

pindaro

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Brasa negra del sueño
























De noche, amada, amarra tu corazón al mío
y que ellos en el sueño derroten las tinieblas
como un doble tambor combatiendo en el bosque
contra el espeso muro de las hojas mojadas.

Nocturna travesía, brasa negra del sueño
interceptando el hilo de las uvas terrestres
con la puntualidad de un tren descabellado
que sombra y piedras frías sin cesar arrastrara.

Por eso, amor, amárrame el movimiento puro,
a la tenacidad que en tu pecho golpea
con las alas de un cisne sumergido,

para que a las preguntas estrelladas del cielo
responda nuestro sueño con una sola llave,
con una sola puerta cerrada por la sombra.

Pablo Neruda


pindaro

quinta-feira, fevereiro 11, 2010

A la niña oculta
























No solo el hoy fragante de tus ojos amo
sino a la niña oculta que allá dentro
mira la vastedad del mundo con redondo
azoro, y amo a la extraña gris que me recuerda
en un rincón del tiempo que el invierno
ampara. La multitud de ti, la fuga de tus horas,
amo tus mil imágenes en vuelo
como un bando de pájaros salvajes.
No solo tu domingo breve de delicias
sino también un viernes trágico, quien
sabe, y un sábado de triunfos y de glorias
que no veré yo nunca, pero alabo.
Niña y muchacha y joven ya mujer,
tu todas, colman mi corazón, y en paz las amo.


Eliseo Diego

pindaro

quarta-feira, fevereiro 10, 2010

Te quiero



















Tus manos son mi caricia,
mis acordes cotidianos;
te quiero porque tus manos
trabajan por la justicia.
Si te quiero es porque sos
mi amor, mi cómplice, y todo.
Y en la calle codo a codo
somos mucho más que dos.
Tus ojos son mi conjuro
contra la mala jornada;
te quiero por tu mirada
que mira y siembra futuro.
Tu boca que es tuya y mía,
Tu boca no se equivoca;
te quiero por que tu boca
sabe gritar rebeldía.
Si te quiero es porque sos
mi amor mi cómplice y todo.
Y en la calle codo a codo
somos mucho más que dos.
Y por tu rostro sincero.
Y tu paso vagabundo.
Y tu llanto por el mundo.
Porque sos pueblo te quiero.
Y porque amor no es aurora,
ni cándida moraleja,
y porque somos pareja
que sabe que no está sola.
Te quiero en mi paraíso;
es decir, que en mi país
la gente vive feliz
aunque no tenga permiso.
Si te quiero es por que sos
mi amor, mi cómplice y todo.
Y en la calle codo a codo
somos mucho más que dos.


Mario Benedetti


pindaro

Instante fugidio





























Visto que o passado morreu e o futuro é representado apenas pelo medo e pelo desejo - que é então este instante fugidio e não mensurável a que é impossível escapar?

Lawrence Durrel

pindaro

terça-feira, fevereiro 09, 2010

Por entre vivas rosas




























Amor, que o gesto humano n' alma escreve,
vivas faíscas me mostrou um dia,
donde um puro cristal se derretia
por entre vivas rosas e alva neve.

A vista, que em si mesma não se atreve,
por se certificar do que ali via,
foi convertida em fonte, que fazia
a dor ao sofrimento doce e leve.

Jura Amor que brandura de vontade
causa o primeiro efeito; o pensamento
endoudece, se cuida que é verdade.

Olhai como Amor gera num momento,
de lágrimas de honesta piedade,
lágrimas de imortal contentamento.


Luis Vaz de Camões

Pindaro

Um sacrário estrelado



















Uma das coisas melhores da nossa vida de tão prosaico século, é o amor, o grande e discutido amor, o nosso encanto e o nosso mistério; as nossas pétalas de rosa e a nossa coroa de espinhos. O amor único, doce e sentimental da nossa alma de portugueses, o amor de que fala Júlio Dantas, «uma ternura casta, uma ternura sã» de que «o peito que o sente é um sacrário estrela­do», como diz Junqueiro; o amor que é a razão única da vida que se vive e da alma que se tem; a paixão delicada que dá beijos ao luar e alma a tudo, desde o olhar ao sorriso, — é ainda uma coisa nobre, bela e digna! Digna de si, do seu sentir, do seu grande coração, ao mesmo tempo violento e calmo. Esse amor que «em sendo triste, canta, e em sendo alegre, chora», esse amor há-de senti-lo um dia, e embora morto, perfumar-lhe-á a alma até à morte, num perfume de saudade que jamais o tempo levará!
Florbela Espanca

pindaro

Largar a presa pela sombra























Eu sou insaciável; mal um desejo surge, outro desponta, e em mim há sempre latente a febre do sonho e do desejo, e quando possuo alguma coisa de infinitamente consolador, como é a sua amizade, desejo mais, mais ainda, mais sempre! Conhece-se em mim o afecto, o amor, a ternura por um egoísmo implacável que quer tornar muito meus, e só meus, os corações que se me dedicam um pouco. Dá isto muitas vezes o resultado de me suceder o mesmo que sucedeu ao cão que largou a presa pela sombra, pois querendo muito, muito perdeu.
Florbela Espanca

pindaro

Coisas de merecimento





A realidade não está simplesmente aqui - é preciso procurá-la e merecê-la.
Paul Celan

pindaro