sexta-feira, novembro 11, 2005

De zero diante do infinito

"Un libro, como un viaje, se comienza con inquietud y se termina con melancolía"
José de Vasconcelos





Alentejo

"Há quem se canse de percorrer as estradas intermináveis e lisas desse latifúndio sem relevos. Há quem adormeça de tédio a olhar a uniformidade da sua paisagem, que no inverno se veste dum pelico castanho, e no verão duma croça madura. Que é parda mesmo quando o trigo desponta, e loura mesmo quando o ceifaram. Queixam-se da melancolia dos estevais negros e peganhosos, que meditam a sua corola branca um ano inteiro, da semelhança aflitiva das azinheiras, que parecem medidas pelo mesmo estalão, e não distinguem nos rebanhos que encontram, quer de ovelhas, quer de porcos, as particularidades que individualizam todo o ser vivo. Afeitos à variedade do Norte, que até aos bichos domésticos consente cara própria e personalidade, aflige-os a constante do Sul, que obriga todo o circunstancial a ocupar o seu lugar de zero diante do infinito. Perdidos e sós no grande descampado, sentem-se desamparados e vulneráveis como crianças. Amedronta-os a solidão de uma natureza que não se esconde por detrás de nenhum acidente, corajosa da sua nudez limpa e total ..."

Miguel Torga



pindaro

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