Quando se ateia em nós um fogo preso, O corpo a corpo em que ele vai girando Faz o meu corpo arder no teu aceso E nos calcina e assim nos vai matando Essa luz repentina até perder alento, E então é quando A sombra se ilumina, E é tudo esquecimento, tão violento e brando. Sacode a luz o nosso ser surpreso E devastados nós vamos a seu mando, Nessa prisão o mundo perde o peso E em fogo preso à noite as chamas vão pairando E vão-se libertando Fogo e contentamento, A revoar num bando De beijos tão sem tento Que não sabemos quando São fogo, ou água, ou vento A revoar num bando De beijos tão sem tento, Que perdem o comando Do próprio esquecimento vasco graça moura
La féminité chez l'homme est comme le sucre dans le whisky. La masculinité chez la femme est comme la levure dans le pain. Sans ces ingrédients, le résultat est plat, sans piquant ni saveur. Edna Ferber
A solidez da terra seca, monótona, parece-nos fraca ilusão. Queremos a solidão do grande mar, multiplicada em suas malhas de perigo. Queremos sua solidão robusta, uma solidão para todos os lados, uma ausência humana que se opõe ao mesquinho formigar do mundo. Cecília Meireles
Escreve para ti, que neste momento entras na sala e ficas por momentos encostada à ombreira da porta, do outro lado da luz, olhando-o. E tu que portanto não és estas letras, como que por dentro delas nasces como se nas conchas da espuma nascesses das águas, como se, ligeiramente inclinada, a custo, começasses a surgir do lado direito do écran, ou estivesses antes ao centro, em grande plano, com olhar velado ou mesmo cega; de qualquer modo como se olhasses para onde não podes olhar. Não podes? Manuel Gusmão
Tómate esta botella conmigo en el último trago nos vamos quiero ver a qué sabe tu olvido sin poner en mis ojos tus manos Esta noche no voy a rogarte Esta noche te vas que de veras que difícil trata de olvidarte y que sienta que ya no me quieras
Nada me han enseñado los años siempre caigo en los mismos errores otra vez a brindar con extraños y a llorar por los mismos dolores
Tómate esta botella conmigo en el último trago me dejas esperamos que no haya testigos por si acaso te diera vergüenza Si algún día sin querer tropezamos no te agaches ni me hables de frente simplemente la mano nos damos y después que murmure la gente
Nada me han enseñado los años...
Tomate esta botella conmingo Y en el último trago nos vamos.
Sonhei comigo esta noite Vi-me ao comprido Deitada Tinha estrelas nos cabelos em meus olhos madrugadas Sonhei comigo esta noite como queria ser sonhada Senti o calor da mão percorrendo uma guitarra De longe vinha um gemido uma voz desabalada Havia um campo de trigo um sol forte me abrasava. E acordei meio sonhando procurando me encontrar Quando me vi ao espelho era teu o meu olhar. Eugénia Tabosa
Em todas as ruas te encontro em todas as ruas te perco conheço tão bem o teu corpo sonhei tanto a tua figura que é de olhos fechados que eu ando a limitar a tua altura e bebo a água e sorvo o ar que te atravessou a cintura tanto, tão perto, tão real que o meu corpo se transfigura e toca o seu próprio elemento num corpo que já não é seu num rio que desapareceu onde um braço teu me procura Em todas as ruas te encontro em todas as ruas te perco. Mário Cesariny de Vasconcelos
Sempre a tentativa nunca vã… O equilíbrio musical dos instrumentos, a paciência do teu pulso suave e certo, o teu rosto mais largo e a calma força que sobe e que modelas palmo a palmo, rio que ascende como um tronco em plena sala. A tua casa habita entre o silêncio e o dia. Entre a alma e a luz o movimento é livre. Acordar a leve chama veia a veia, erguê-la do fundo e solta propagá-la aos membros e ao ventre, até ao peito e às mãos e que a cabeça ascenda, cordial corola plena. Todo o corpo é uma onda, uma coluna flexível. Respiras lentamente. A terra inteira é viva. E sentes o teu sangue harmonioso e livre correr ligado à água, ao ar, ao fogo lúcido. No interior centro cálido abre-se a flor da luz, rigor suave e óleo, música de músculos, roda lenta girando das ancas ao busto ondeado e cada vez mais ampla a onda livre ondula a todo o corpo uno, num respirar de vela. Sobre a toalha de água, à luz de um sol real, dança e respira, respira e dança a vida, o seu corpo é um barco que o próprio mar modela. António Ramos Rosa
Cuerpo de mujer, blancas colinas, muslos blancos, te pareces al mundo en tu actitud de entrega. Mi cuerpo de labriego salvaje te socava y hace saltar el hijo del fondo de la tierra.
Fui solo como un túnel. De mí huían los pájaros y en mí la noche entraba su invasión poderosa. Para sobrevivirme te forjé como un arma, como una flecha en mi arco, como una piedra en mi honda.
Pero cae la hora de la venganza, y te amo. Cuerpo de piel, de musgo, de leche ávida y firme. ¡Ah los vasos del pecho! ¡Ah los ojos de ausencia! ¡Ah las rosas del pubis! ¡Ah tu voz lenta y triste!
Cuerpo de mujer mía, persistiré en tu gracia. Mi sed, mi ansia si límite, mi camino indeciso! Oscuros cauces donde la sed eterna sigue, y la fatiga sigue, y el dolor infinito. Pablo Neruda
O amor é uma coisa muito interior, algo que não se pode explicar. Os românticos diziam que era um puro movimento das emoções e tampouco se pode explicar como uma sublimação do instinto sexual. No amor, há algo mais, é uma coisa estranha, algo que implica tudo o que é a condição humana: o instinto, o sexo, a paixão, também o espírito e certos fantasmas do inconsciente que rapidamente se instalam num tipo de relação que faz aparecer o melhor e o pior das pessoas.
O que a voz não pode exprimir juntamente em diferentes lugares e a diversas pessoas em um mesmo tempo, o faz a escritura com grande perfeição... Francisco Roiz Lobo
Conheci jovens que saíram do mundo dos deuses. Os seus gestos faziam pensar nas trajectórias dos astros; não nos espantávamos de achar insensível o seu duro coração de mármore; se estendiam a mão, a rapacidade daqueles mendigos requintados era um vício de deuses.
Como todos os deuses, apresentavam inquietantes parentescos com os lobos, os chacais, as víboras...
L'océan resplendit sous sa vaste nuée. L'onde, de son combat sans fin exténuée, S'assoupit, et, laissant l'écueil se reposer, Fait de toute la rive un immense baiser. Victor Hugo
Compreender não é procurar no que nos é estranho a nossa projecção ou a projecção do nossos desejos. É explicar o que se nos opõe, valorizar o que até aí não tinha valor dentro de nós. O diverso, o inesperado, o antagónico, é que são a pedra de toque dum acto de entendimento. Miguel Torga
Escutai o mar O mar geme ao longe e grita na solidão A minha voz fiel como a sombra Quer ser finalmente a sombra da vida Quer ser, ó mar vivo, infiel como tu
Porque has vuelto los misterios del revés. Y tus enigmas, lo que nunca entenderás, son esas cosas tan claras: la arena donde te tiendes, la marcha de tu reloj y el tierno cuerpo rosado que te encuentras en tu espejo cada día al despertar, y es el tuyo. Los prodigios que están descifrados ya.
Y nunca te equivocaste, más que una vez, una noche que te encaprichó una sombra -la única que te ha gustado-. Una sombra parecía. Y la quisiste abrazar. Y era yo. Pedro Salinas
A noite era uma possibilidade excepcional. Em plena noite fechada de um verão escaldante um galo soltou seu grito fora de hora e uma só vez para alertar o início da subida pela montanha. A multidão embaixo aguardava em silêncio. Ele-ela já estava presente no alto da montanha, e ela estava personalizada no ele e o ele estava personalizado no ela. A mistura andrógina criava um ser tão terrivelmente belo, tão horrorosamente estupefaciente que os participantes não poderiam olhá-lo de uma só vez: assim como uma pessoa vai pouco a pouco se habituando ao escuro e aos poucos enxergando. Aos poucos enxergavam o Ela-ele e quando o Ele-ela lhes aparecia com uma claridade que emanava dela-dele, eles paralisados pelo que é Belo diriam: "Ah, Ah". Era uma exclamação que era permitida no silêncio da noite. Olhavam a assustadora beleza e seu perigo. Mas eles haviam vindo exatamente para sofrer o perigo. (...) Epílogo: Tudo o que escrevi é verdade e existe. Existe uma mente universal que me guiou. Onde estivestes de noite? Ninguém sabe. Não tentes responder - pelo amor de Deus. Não quero saber da resposta. Adeus. A-Deus. Clarice Lispector
Plena mulher, maçã carnal, lua quente, espesso aroma de algas, lodo e luz pisados, que obscura claridade se abre entre tuas colunas? que antiga noite o homem toca com seus sentidos? Ai, amar é uma viagem com água e com estrelas, com ar opresso e bruscas tempestades de farinha: amar é um combate de relâmpagos e dois corpos por um só mel derrotados. Beijo a beijo percorro teu pequeno infinito, tuas margens, teus rios, teus povoados pequenos, e o fogo genital transformado em delícia corre pelos tênues caminhos do sangue até precipitar-se como um cravo nocturno, até ser e não ser senão na sombra de um raio. Pablo Neruda