segunda-feira, janeiro 12, 2009

A beleza do rumor entranhado





D. Duarte, Duarte Nunes de Leão, Almeida Garret e Pascoaes, entre outros antigos vultos, tinham a palavra saudade ( soidade para D. Dinis) como um exclusivo pátrio, um termo só da nossa terra, intraduzível.

Dizia mesmo o Visconde João Baptista que “... o sentimento por ele representado, certo que em todos os países o sentem; mas que haja um vocábulo especial para o designar, não sei de nenhuma outra linguagem senão da portuguesa...”

Só mais à frente, século passado adentro, o dogma quase mágico foi removido.

De facto, outras nações têm para a saudade um termo só seu: o galego tem soledades ou soedades; o catalão, anyoransa ou anyoramento; o italiano, desio ou disio; o romeno doru ou dor; o sueco, saknad; o dinamarquês, savn; e o islandês, saknaor.

O filólogo Manuel de Melo abriu o capote a este bicho, com luzimento, em Notas Lexicológicas.

Falando das canções melancólicas dos romenos, Cratiunesco volteava sobre doru:
Ce mot semble venir du mot latin desiderium, dont il exprime tous les nuances – le regret d´un bien perdu, le chagrin que cause son absence, l´ésperance de le recouvrer, le désir d´un bonheur, que l´on ne connait point encore et l´ivresse que en accompagne la posséssion.”

E, em francês, dava-se ao doru do poeta Alecandri o sentido de “désir mêlé de regret”.

Vamos, ainda, ao Purgatorio, com Dante:

“Era giá l´ora che volge il disio
Ai naviganti, e intenerisci il cuore
Lo di che han ai dolci amici addio;

E che lo nuovo peregrin d´amore
Punge, se ode aquilla di lontano,
Che peja il giorno pianger che si more”


( “
C´était déja l´heure qui réveille les regrets
des navigateurs et attendrit leur âmme
”, etc.
-Fiorentino)

Saudade, essa palavra para uma “mimosa paixão da alma”
(D. Francisco Manuel de Melo), não é só nossa.
E é de folgar que assim seja.
O contrário seria uma desordenança.
Das grandes.



Leonardo

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