quinta-feira, novembro 30, 2006
En la melancolía
Ha venido tu lengua; está en mi boca
como una fruta en la melancolía...
António Gamoneda
pindaro
Cavalo à solta
Minha laranja amarga e doce
meu poema
feito de gomos de saudade
minha pena
pesada e leve
secreta e pura
minha passagem para o breve breve
instante da loucura.
Minha ousadia
meu galope
minha rédea
meu potro doido
minha chama
minha réstia
de luz intensa
de voz aberta
minha denúncia do que pensa
do que sente a gente certa.
Em ti respiro
em ti eu provo
por ti consigo
esta força que de novo
em ti persigo
em ti percorro
cavalo à solta
pela margem do teu corpo.
Minha alegria
minha amargura
minha coragem de correr contra a ternura.
Por isso digo
canção castigo
amêndoa travo corpo alma amante amigo
por isso canto
por isso digo
alpendre casa cama arca do meu trigo.
Meu desafio
minha aventura
minha coragem de correr contra a ternura.
J. C. Ary dos Santos
pindaro
Oa atalhos e os labirintos
A vida é um charuto
morrão, cinza e candeia
Uns fumam-na depressa
Alguns saboreiam-na.
Manuel Machado
Cantos Andaluzes
pindaro
Terra limpa
Devias estar aqui rente aos meus lábios
para dividir contigo esta amargura
dos meus dias partidos um a um
- Eu vi a terra limpa no teu rosto,
Só no teu rosto e nunca em mais nenhum
Eugénio de Andrade
pindaro
quarta-feira, novembro 29, 2006
Como no mar
Amiga, infinitamente amiga
Em algum lugar teu coração bate por mim
Em algum lugar teus olhos se fecham à idéia dos meus.
Em algum lugar tuas mãos se crispam, teus seios
Se enchem de leite, tu desfaleces e caminhas
Como que cega ao meu encontro...
Amiga, última doçura
A tranqüilidade suavizou a minha pele
E os meus cabelos. Só meu ventre
Te espera, cheio de raízes e de sombras.
Vem, amiga
Minha nudez é absoluta
Meus olhos são espelhos para o teu desejo
E meu peito é tábua de suplícios
Vem. Meus músculos estão doces para os teus dentes
E áspera é minha barba. Vem mergulhar em mim
Como no mar, vem nadar em mim como no mar
Vem te afogar em mim, amiga minha
Em mim como no mar...
Vinicius de Moraes
pindaro
Os caminhos da noite
Atravessa os caminhos da noite
e vem.
Nas fontes, vivas,
do meu corpo
saciarás a tua sede.
Os ramos dos meus braços
serão sombra rumorejante
ao teu sono, exausto.
Atravessa os campos da noite
e vem.
Luisa Dacosta
pindaro
Lusco-fusco
Quando vemos uma sombra é porque há uma luz. A sombra é mistério, a luz claridade. A sombra encobre, a luz descobre. Saber o que se deve encobrir e o que se deve descobrir e o tempo e o modo de o fazer - isso é a arte.
Sternberg
pindaro
Caminante no hay camino...
Todo pasa y todo queda,
pero lo nuestro es pasar,
pasar haciendo caminos,
caminos sobre el mar.
Nunca persequí la gloria,
ni dejar en la memoria
de los hombres mi canción;
yo amo los mundos sutiles,
ingrávidos y gentiles,
como pompas de jabón.
Me gusta verlos pintarse
de sol y grana, volar
bajo el cielo azul, temblar
súbitamente y quebrarse...
Nunca perseguí la gloria.
Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.
Al andar se hace camino
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.
Caminante no hay camino
sino estelas en la mar...
Hace algún tiempo en ese lugar
donde hoy los bosques se visten de espinos
se oyó la voz de un poeta gritar
"Caminante no hay camino,
se hace camino al andar..."
Golpe a golpe, verso a verso...
Murió el poeta lejos del hogar.
Le cubre el polvo de un país vecino.
Al alejarse le vieron llorar.
"Caminante no hay camino,
se hace camino al andar..."
Golpe a golpe, verso a verso...
Cuando el jilguero no puede cantar.
Cuando el poeta es un peregrino,
cuando de nada nos sirve rezar.
"Caminante no hay camino,
se hace camino al andar..."
Golpe a golpe, verso a verso.
Antonio Machado
pindaro
Que no acaba
Este silencio,
blanco, ilimitado,
este silencio
del mar tranquilo, inmóvil,
que de pronto
rompen los leves caracoles
por un impulso de la brisa,
Se extiende acaso
de la tarde a la noche, se remansa
tal vez por la arenilla
de fuego,
la infinita
playa desierta,
de manera
que no acaba,
quizás,
este silencio,
nunca?
Eliseo Diego
pindaro
terça-feira, novembro 28, 2006
Retenção na fonte
O melhor que fixamos não é o que aprendemos, mas o que amamos.
Agustina Bessa-Luís
pindaro
La intemperie de un gemido
Será mejor entonces, mujer, dejar de vernos,
apartar los labios teñidos de vino
y maquillar la roja mordedura del amor
ante viejos espejos carcomidos?
Nunca tendremos una casa, es cierto,
pero la intemperie de un gemido ha sido nuestro hogar.
No habrán aniversarios ni flores
pero tú rodarás interminablemente
entre las flores de mi sueño hasta mi tumba.
lo que la carne une nada lo separa:
ni Dios ni el tiempo ni el tempo ni el olvido.
el deseo planta un árbol del que una gran cauda de
Pájaros desciende
Para beber en la fuente lasciva de la sangre.
Rafael Vargas
pindaro
segunda-feira, novembro 27, 2006
No som das ondas
Que voz vem no som das ondas
Que não é a voz do mar?
É a voz de alguém que nos falla,
Mas que, se escutarmos, calla,
Por ter havido escutar.
Fernando Pessoa
pindaro
Orgia olímpica de feras
Corpo de ebúrnea pele, ó carne de alva infância!
entorna sobre mim o teu sangue pisado...
enlaça-me o pescoço em voluptuosa ânsia,
como se enlaça a corda à gorja do enforcado!
Morde-me o corpo, flor! Com teus espinhos de aço,
morde-me o olhar que chora e os lábios que dão ais...
Morde-me a fronte, os pés! Arranca-me um pedaço!
Queres auxilio? Pede o sabre aos generais.
Aguça a boca! Afia os dentes como espadas,
Sabá! pedra amoladora do meu seio
e, após as fundas, crúeis e vermelhas dentadas,
chupa-me o sangue a arder, abre-me o corpo ao meio!
Vamos! Trovões! O meu noivado ilustre!
À carne! À ceia! A mesa está posta, anda ver:
o céu aceso de relâmpagos é o lustre:
nosso padrinho, Deus, já o mandou acender...
Os convidados são os tigres, as panteras,
que de Além-Mar vêm assistir às nossa bodas...
E tu, naquela orgia olímpica de feras,
devora-me, também, fera maior que todas!
Ó meu amor! Atende aos meus uivos funéreos!
Piedade! Vem! Sossega-os: dá mais pasto aos leões,
grita: façamos acordar os cemitérios!
E os defuntos uivar dentro dos caixões.
Quero-te ver, assim, estatelada, nua,
capaz de seduzir os mortos com desejos...
Ah, que o teu cio chegue aos astros, flor da Rua!
Que Jesus desça à Terra, a cobrir-te de beijos,
que o oceano aperte, enfim, em seus braços a Lua!...
Antonio Nobre
pindaro
Exercício espiritual
É preciso dizer rosa
em vez de dizer ideia
é preciso dizer azul
em vez de dizer pantera
é preciso dizer febre
em vez de dizer inocência
é preciso dizer o mundo
em vez de dizer um homem
É preciso dizer candelabro
em vez de dizer arcano
é preciso dizer Para Sempre
em vez de dizer Agora
é preciso dizer O Dia
em vez de dizer Um Ano
é preciso dizer Maria
em vez de dizer aurora
Mario Cesariny
pindaro
Discurso ao príncipe de Epaminondas, mancebo de grande futuro
Despe-te de verdades
das grandes primeiro que das pequenas
das tuas antes que de quaisquer outras
abre uma cova e enterra-as
a teu lado
primeiro as que te impuseram eras ainda imbele
e não possuías mácula senão a de um nome estranho
depois as que crescendo penosamente vestiste
a verdade do pão a verdade das lágrimas
pois não és flor nem luto nem acalanto nem estrela
depois as que ganhaste com o teu sémen
onde a manhã ergue um espelho vazio
e uma criança chora entre nuvens e abismos
depois as que hão-de pôr em cima do teu retrato
quando lhes forneceres a grande recordação
que todos esperam tanto porque a esperam de ti
Nada depois, só tu e o teu silêncio
e veias de coral rasgando-nos os pulsos
Então, meu senhor, poderemos passar
pela planície nua
o teu corpo com nuvens pelos ombros
as minhas mãos cheias de barbas brancas
Aí não haverá demora nem abrigo nem chegada
mas um quadrado de fogo sobre as nossas cabeças
e uma estrada de pedra até ao fim das luzes
e um silêncio de morte à nossa passagem
Mário Cesariny
domingo, novembro 26, 2006
As cousas por vício
Isto do fácil não há sagrado a que se acolha; Nada defende o que não se defenda, nem pode ser conquistado de nenhum ânimo generoso o que não custa. As dificuldades apetecem por honra, as cousas por vício.
D.Francisco de Portugal
Arte de Galanteria
pindaro
Que não se vê
O que faz andar o barco não é a vela enfunada, mas o vento que não se vê.
Platão
pindaro
O amor fino
O amor fino não há-de ter porquê nem para quê.
Se amo porque me amam, é obrigação, faço o que devo; se amo para que me amem, é negociação, busco o que desejo.
Pois como há-de ser o amor para ser fino?
Amo porque amo e para amar.
Padre António Vieira
pindaro
Re versos
Jadis, si je me souviens bien, ma vie était un festin où s’ouvraient tous les cœurs, où tous les vins coulaient.
Un soir, j’ai assis la Beauté sur mes genoux – Et je l’ai trouvée amère...
Rimbaud
pindaro
Y los sueños, sueños son
Yo sueño que estoy aquí
destas prisiones cargado,
y soñé que en otro estado
más lisonjero me vi.
Qué es la vida? Un frenesí.
Qué es la vida? Una ilusión,
una sombra, una ficción,
y el mayor bien es pequeño:
que toda la vida es sueño,
y los sueños, sueños son.
Calderón de la Barca
pindaro
O impossível perfume
Ah, que a mulher de sempre a impressão de que se fechar os olhos
Ao abri-los ela não estará mais presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação imunerável
Vinicius de Moraes
pindaro
A construção do efémero
É melhor não fazermos muitos planos para a vida para não baralharmos os planos que a vida tenha para nós
agostinho da silva
pindaro
Linha de sombra
Há uma linha de sombra de que falava o escritor Joseph Conrad que uma vez transposta não tem retorno.
Solino
sexta-feira, novembro 24, 2006
Segunda-feira
O que é o amor? O amor é assim:
Hoje beija-se, amanhã não se beija,
Depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe o que será…
Carlos Drummond de Andrade
píndaro
quinta-feira, novembro 23, 2006
Y la figura
Descubre tu presencia
y mateme tu vista, y hermosura,
mira que la dolencia
de amor no bien se cura,
sino con la presencia, y la figura.
S. João da Cruz
pindaro
A sombra da casa onde nasci
Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.
Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
És a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.
Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão...
Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que me sai, sem voz, do coração.
David Mourão-Ferreira
pindaro
Singulière
quarta-feira, novembro 22, 2006
Bombocado de pecado
Morango maduro
morango maduro
não manga de mim
Espera aí
Quiuinstante não d’amora
Vem cajá
Melãobuza agora
Que eu relanceio por um beijo seu
Amarmelada, maçã do amor
Pequi Umbucado
e vem cáqui o meu coração
Pulsaporti
jatobacana, bombocado de pecado.
Jacira Rodrigues
pindaro
Cantiga para Hilária, polpuda e licorosa
Senhora, partem tam tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
Tam tristes, tam saudosos,
tam doentes da partida,
tam cansados, tam chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tam tristes os tristes,
tam fora d´esperar bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
João Roiz de Castel-Branco
pindaro
Au vent et à l´onde
Qu'importe au vent ! qu'importe à l'onde !
Une femme est noire, une est blonde,
L'autre est d'Alep ou d'Ispahan ;
Toutes tremblent devant ta face ;
Et que veut-on que cela fasse
Au mystérieux océan ?
Victor Hugo
pindaro
Et je persiste
«En proie aux événements comme vous aux vents, je constate leur démence apparente et leur logique profonde ; je sens que la tempête est une volonté, et que ma conscience en est une autre, et qu'au fond elles sont d'accord ; et je persiste, et je résiste, [...] et je fais mon devoir, pas plus ému de la haine que vous de l'écume.»
Victor Hugo
Pindaro
Génie
"Il y a des hommes óceans en effet.
Ces ondes, ce flux et ce reflux, ce va-et-vient terrible, ce bruit de tous les souffles, ces noirceurs et ces transparences, ces végétations propres au gouffre, cette démagogie des nués en plein ouragan, ces aigles dans l´écume,
(...)
Tou cela peut être dans un esprit, et alors cet esprit s´appelle génie."
Victor Hugo
pindaro
Meu mal e meu ben
Senhor, eu vivo coitada
vida, des quando vos non vi:
mais, pois vós queredes assi,
por Deus, senhor ben talhada,
querede-vos de mim doer
ou ar leixade-m'ir morrer.
Vós sodes tan poderosa
de min que meu mal e meu ben
en vós é todo; [e] por en,
por Deus, mha senhor fremosa,
querede-vos de mim doer
ou ar leixade-m'ir morrer.
Eu vivo por vós tal vida
que nunca estes olhos meus
dormen, mnha senhor; e, por Deus,
que vos fez de ben comprida,
querede-vos de mim doer
ou ar leixade-m'ir morrer.
Ca, senhor, todo m' é prazer
quant' i vós quiserdes fazer.
D.Dinis
pindaro
En exercice
La raison, c'est l'intelligence en exercice ; l'imagination c'est l'intelligence en érection.
Victor Hugo
Pindaro
terça-feira, novembro 21, 2006
Mar sólo
En ti estás todo, mar, y sin embargo,
qué sin ti estás, qué solo,
qué lejos, siempre, de ti mismo!
Abierto en mil heridas, cada instante,
cual mi frente,
tus olas van, como mis pensamientos,
y vienen, van y vienen,
besándose, apartándose,
en un eterno conocerse,
mar, y desconocerse.
Eres tú, y no lo sabes,
tu corazón te late y no lo siente...
Qué plenitud de soledad, mar sólo!
Juan Ramón Jiménez
pindaro
Turning shadow into transient beauty
Here is a place of disaffection
Time before and time after
In a dim light: neither daylight
Investing form with lucid stillness
Turning shadow into transient beauty
With slow rotation suggesting permanence
Nor darkness to purify the soul
Emptyng the sensual with deprivation
Cleansig affection from the temporal.
T. S. Eliot
pindaro
segunda-feira, novembro 20, 2006
De baixo para cima
Não te amo mais.
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
EU TE AMO!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...
Clarice Lispector
pindaro
Jeito manso
O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
E que me deixa louca
Quando me beija a boca
A minha pele inteira fica arrepiada
E me beija com calma e fundo
Até minh'alma se sentir beijada, ai
O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
Que rouba os meus sentidos
Viola os meus ouvidos
Com tantos segredos lindos e indecentes
Depois brinca comigo
Ri do meu umbigo
E me crava os dentes, ai
Eu sou sua menina, viu?
E ele é o meu rapaz
Meu corpo é testemunha
Do bem que ele me faz
O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
De me deixar maluca
Quando me roça a nuca
E quase me machuca com a barba malfeita
E de pousar as coxas entre as minhas coxas
Quando ele se deita, ai
O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
De me fazer rodeios
De me beijar os seios
Me beijar o ventre
E me deixar em brasa
Desfruta do meu corpo
Como se o meu corpo fosse a sua casa, ai
Eu sou sua menina, viu?
E ele é o meu rapaz
Meu corpo é testemunha
Do bem que ele me faz
Chico Buarque
pindaro
Quand j` écoute
Aimons! C`est à cela que je songe, le soir,
Quand j` écoute, debout sur le rivage noir,
Parmis les cris des mouettes brunes
Et des oiseaux de mer pour me voir arrivant,
Les angélus lointains dispersés dans le vent
Sonner dans les sables des dunes
Victor Hugo
pindaro
Com brandura gasalhosa
Todas as noites ela me cingia
nos braços, com brandura gasalhosa;
Todas as noites eu adormecia,
sentindo-a desleixada e langorosa.
Todas as noites uma fantasia
lhe emanava da fronte imaginosa;
Todas as noites tinha uma mania
aquela concepção vertiginosa.
Agora, há quase um mês, modernamente,
ela tinha um furor dos mais soturnos,
furor original, impertinente...
Todas as noites ela, ó sordidez!,
descalçava-me as botas, os coturnos
e fazia-me cócegas nos pés...
Cesário Verde
pindaro
O som lírico
Só a rajada de vento
dá o som lírico
às pás do moinho.
Somente as coisas tocadas
pelo amor das outras
têm voz
Fiama H. P. Brandão
pindaro
domingo, novembro 19, 2006
Blasé
Em nada de particular
Essa típica errância que não é vacuidade, essa ingenuidade que não é simplicidade, esse ar de quem se empenha em tudo, sem se empenhar em nada de particular, essa generosa abertura a todas as possibilidades da vida, esse olhar em que a inocência e a experiência tão singularmente se misturam...
Henry James
pindaro
A sabedoria do destino
No fundo, a sabedoria do destino é a nossa própria. Porque a acompanhamos com uma consciência incessante daquilo que, no fundo, nos é permitido fazer. Podemos estar sujeitos a algumas tentações mas nunca nos enganamos. Agimos sempre no sentido do destino. As duas coisas formam uma só.
Quem se engana é porque ainda não compreende o seu destino. Quer dizer, não compreende qual a resultante de todo o seu passado - o qual lhe indica o futuro. Mas quer o compreenda ou não, indica-lho à mesma. Cada vida é aquilo que devia ser.
Cesare Pavese
pindaro
Novembro
sábado, novembro 18, 2006
El pecado nació para escondido
Sólo en tí, Lesbia, vemos que ha perdido
el adulterio la vergüenza al cielo;
pues que tan claramente y tan sin velo
has los hidalgos huesos ofendido.
Por Dios, por ti, por mí, por tu marido,
que no sepa tu infamia todo el suelo;
cierra la puerta, vive con recelo;
que el pecado nació para escondido.
No digo yo que dejes tus amigos;
mas digo que no es bien que sean notados
de los pocos que son tus enemigos.
Mira que tus vecinos, afrentados,
dicen que te deleitan los testigos
de tus pecados más que tus pecados.
D. Francisco de Quevedo
pindaro