Primeiramente o sal (disse o Doutor Lívio), a quem um autor chamou conduto de todos os outros, é o que dá sabor e faz apetite ao desejo para todos eles.
- Muito se parece nisso com a fome (acudiu Solino).
-Assim é (disse o Doutor), porém tem de mais que os conserva e sustenta com sua força; por os quais atributos Homero e Platão chamaram ao sal divino; e assim como os mantimentos sem ele não obrigam a vontade assim por ele, como disse Plínio, significamos os afeitos do ânimo, chamando homem sem sal, prática sem ele, riso em sosso, e ainda fermosura sem sal, como escreveu Catulo de Quíncia que, pintando-a fermosa, branca e comprida, diz que em toda aquela figura não havia pedra de sal.
De maneira que, conforme a este sentido, o sal é uma graça ou composição da prática, do rosto ou do movimento do andar, que faz as pessoas aprazíveis.
E esta, segundo alguns, particularmente se declara no que obriga a siso e alegria, com um modo de murmuração leve.
Donde Séneca disse que o sal da conversação dos amigos não havia de ter dentes; e assim como os mantimentos que têm mais sal fazem maior sede a quem os come, assim a conversação, que tem mais dele, é mais apetitosa e desejada dos ouvintes e como, sem sal, todas as iguarias são sem sabores e desgostosas, assim a prática onde a sua graça falta é puro fastio.
Porém, quanto a mim, o que da tenção destes autores convém mais com o nosso modo de falar, sal quer dizer graça, que é o contrário da frieza e sensaboria, e dizemos do gracioso que é salgado, e do bem dito, que tem muito sal, e do que o não é, que não tem nenhum.
Sendo a causa geral porque lhes parecia aos antigos que se apartava e perdia a amizade, entornando-se o sal que na mesa fazia a figura dela.
E, à semelhança, tinham por boa sorte derramar-se o vinho, que como era símbolo de alegria e contentamento, desejavam que entre todos se espalhasse.
Francisco Roíz Lobo (Corte na Aldeia)
píndaro
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