Perto do Mar A água de uma floresta onde todos os pássaros são dedos submersos O lugar dos corpos até ao fundo arde
Podemos subir descer perto do mar a longa escada verde inteira e leve até à beira das grandes pedras
onde o silêncio da terra cresceu à altura das árvores unânime sabor enorme das folhas que nas mãos
se enrolam frescas somos quase a água de um segredo
como se nascessemos com os punhos rolados no mar o solo até à boca os ossos vivos no abraço
a cinza verde que se sorve é a seiva de um ar ardente e novo para uns lábios juntos no silêncio das palavras jovens
Vivos entre as hastes pelos olhos os elos do ar ligam-nos a um corpo único todas as gavetas se dissolvem e delas sai a pomba da água unida cujo bico aponta o sol na clareira
Animais do sol levíssimos propagamo-nos no azul da terra nos verdes claros nos castanhos densos nos negros
comemos os frutos das cores dadas as pedras as pinhas as agulhas cantando quase o mar
Cai a noite sobre um muro branco a plenitude da folhagem no silêncio
nos nós verdes inundados pela sombra não nos perdemos entre as árvores e as espigas
sentindo o áspero gosto das pedras o pó miúdo e solto sobre as faces o grande sorvo fresco da aragem noite ou mar por um caminho em que as estrelas se dispersam
como as palavras de um texto os lábios sobram do excesso suave e grande e soletram no silêncio do ar nocturno
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Perto do Mar
A água de uma floresta
onde todos os pássaros são dedos submersos
O lugar dos corpos
até ao fundo arde
Podemos subir descer
perto do mar
a longa escada verde inteira e leve
até à beira das grandes pedras
onde o silêncio da terra
cresceu à altura das árvores
unânime sabor enorme das folhas que nas mãos
se enrolam frescas
somos quase a água de um segredo
como se nascessemos
com os punhos rolados no mar
o solo até à boca
os ossos vivos no abraço
a cinza verde que se sorve é a seiva
de um ar ardente e novo
para uns lábios juntos
no silêncio das palavras jovens
Vivos entre as hastes pelos olhos
os elos do ar ligam-nos a um corpo único
todas as gavetas se dissolvem
e delas sai a pomba da água unida
cujo bico aponta o sol na clareira
Animais do sol levíssimos
propagamo-nos no azul da terra
nos verdes claros nos castanhos densos nos negros
comemos os frutos das cores dadas
as pedras as pinhas as agulhas
cantando quase o mar
Cai a noite
sobre um muro branco
a plenitude da folhagem no silêncio
nos nós verdes inundados pela sombra
não nos perdemos entre as árvores e as espigas
sentindo o áspero gosto das pedras
o pó miúdo e solto sobre as faces
o grande sorvo fresco da aragem
noite ou mar
por um caminho em que as estrelas se dispersam
como as palavras de um texto
os lábios sobram do excesso suave e grande
e soletram no silêncio do ar nocturno
António Ramos Rosa
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