sexta-feira, setembro 30, 2005
Tudo quanto é, passa
"Agora quisera eu perguntar ao mundo, se como me enche a memória de tantas coisas, que todas passaram, me mostrará alguma aos olhos que não passasse?
As sete fábricas a que a fama deu o nome de maravilhas, acrescentaram alguns como oitava o anfiteatro romano.
Mas a maravilha oitava, ou nona, é que todas essas maravilhas, que pareciam eternas, passaram.
A primeira maravilha foram as pirâmides do Egito, a segunda os muros de Babilônia, a terceira a torre de Faros, a quarta o colosso de Rodes, a quinta o mausoléu de Cária, a sexta o Templo de Diana Efesina, a sétima o simulacro de Júpiter Olímpico.
E deixando o anfiteatro, de que só se vêem as ruínas, as pirâmides caíram, os muros arrasaram-se, o colosso desfez-se, o mausoléu sepultou-se, a torre sumiu-se, o farol apagou-se, o templo ardeu, e o simulacro como simulacro, desvaneceu-se em si mesmo.
Tem mais que dizer, ou que opor o mundo? Só pode apelar para as mais fortes e bem fundadas cidades, cortes e metrópoles dos mais poderosos impérios: argumento verdadeiramente de grande boato, antes de se lhe tomar o peso.
Nínive, corte de Nino, foi a maior cidade do mundo: andava-se de porta a porta, não menos que em três dias de caminho; edificada de propósito com arrogância de que nenhuma outra a igualasse, como não igualou. Mas onde está essa Nínive?
Ecbátana, corte de Arfaxad, e cidade que o texto sagrado chama potentíssima, era cercada de sete ordens de muros, todos de pedras quadradas, cada uma com vinte e sete palmos por todas as faces, e as portas com a prodigiosa. altura de cem côvados. Mas onde está essa Ecbátana?
Susa, corte de Assuero, e metrópole de cento e vinte e sete Províncias, cujo palácio representava um céu estrelado, fundado sobre colunas de oiro e pedras preciosas, e cujos muros eram de mármores brancos e jaspes de diferentes cores; bem se deixa ver quão forte e inexpugnável seria, pois defendia tão grande monarca, dominava tantos reinos e guardava tantos tesouros. Mas onde está essa Suas?
Se houvéssemos de fazer a mesma pergunta às ruínas de Tebas, de Memphis, de Bactra, de Cartago, de Corinto, de Sebaste, e da mais conhecida de todas, Jerusalém, necessário seria dar volta a toda a redondeza da Terra.
De Tróia disse Ovídio: Jam seges est ubi Troia fuit .E o mesmo podemos dizer das planícies, vales e montes, donde se levantavam às nuvens aqueles vastíssimos corpos de casas, muralhas e torres. De umas se não sabem os lugares onde estiveram; doutras se lavram, semeiam, e plantam os mesmos lugares, sem mais vestígios de haverem sido, que os que encontram os arados, quando rompem a terra.
Para que os homens compostos de carne e sangue se não queixem da brevidade da vida, pois também as pedras morrem; e para que ninguém se atreva a negar, que tudo quanto houve, passou, e tudo quanto é, passa."
padre Antonio Vieira
pindaro
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