terça-feira, fevereiro 01, 2005

Louvor da língua aprazível

“...e, levantando-se ele, se despediram todos com muita cortesia, deixando ao senhor da casa magoado de se acabar tão depressa a conversação; que quem sabe estimar a que é tão boa, tem sentimento das horas que dela perde.”
F.R.L





(...)

- Bravamente é apaixonado o senhor D. Júlio (acudiu o Doutor) pelas cousas da nossa Pátria, e tem razão, que é dívida que os nobres devem pagar com maior pontualidade à terra que os criou. E verdadeiramente que não tenho a nossa língua por grosseira, nem por bons os argumentos com que alguns querem provar que é essa; antes é branda para deleitar, grave para engrandecer, eficaz para mover, doce para pronunciar, breve para resolver e acomodada às matérias mais importantes da prática e da escritura.

Para falar é engraçada com um todo senhoril, para cantar é suave com um certo movimento que favorece a música; para pregar é substanciosa, com uma gravidade que autoriza as razões e as sentenças; para escrever cartas nem tem infinita cópia que dane, nem brevidade estéril que a limite; para histórias nem é tão florida que se derrame, nem tão seca que busque o favor das alheias.

A pronunciação não obriga a ferir o céu da boca com aspereza, nem a arrancar as palavras com veemência de gargalo. Escreve-se da maneira que se lê, e assim se fala.
Tem de todas as línguas o melhor: a pronunciação da Latina, a origem da Grega, a familiaridade da Castelhana, a brandura da Francesa, a elegância da Italiana. Tem mais adágios e sentenças que todas as vulgares, em fé da sua antiguidade.

E se à língua Hebreia, pela honestidade das palavras, chamaram santa, certo que não sei eu outra que tanto fuja de palavras claras em matéria descomposta quanto a nossa. E, para que diga tudo, só um mal tem: e é que, pelo pouco que lhe querem os seus naturais, a trazem mais remendada que capa de pedinte.

(...)



F. Roíz Lobo

1 comentário:

Vicktor Reis disse...

Caros Amigos. Este comentário vale para os diversos autores deste blogue muito embora colocado aqui. Bem hajam pela defesa que fazem da língua portuguesa em belos textos aqui apresentados. Além do mais com uma temática deveras aliciante. Um abraço.