sexta-feira, agosto 07, 2009
Nos aplastra caprichosamente
Esas olas verdes, mansas, esas espumas blanquecinas donde se mece nuestra pupila, van como rozando nuestra alma, desgastando nuestra personalidad, hasta hacerla puramente contemplativa, hasta identificarla con la Naturaleza.
Queremos comprender al mar, y no le comprendemos; queremos hallarle una razón, y no se la hallamos. Es un monstruo, una esfinge incomprensible; muerto es el laboratorio de la vida, inerte es la representación de la constante inquietud. Muchas veces sospechamos si habrá en él escondido algo como una lección; en momentos se figura uno haber descifrado su misterio; en otros, se nos escapa su enseñanza y se pierde en el reflejo de las olas y en el silbido del viento.
Todos, sin saber por qué, suponemos al mar mujer, todos le dotamos de una personalidad instintiva y cambiante, enigmática y pérfida.
En la Naturaleza, en los árboles y en las plantas, hay una vaga sombra de justicia y de bondad; en el mar, no: el mar nos sonríe, nos acaricia, nos amenaza, nos aplasta caprichosamente.
Pio Baroja
pindaro
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1 comentário:
Naquela Baia Azul, em Benguela, as águas do mar são estranhamente quietas e transparentes. Como vidro esmeralda.
Kalunga chama-a, puxa-a, seduze- a até si.
Ali, tocando a orla duma costa onde homens vendiam homens a outros homens.
Ali, ela costuma levantar-se muito cedo pela manhã.
Após acender uma vela perfumada, coloca-a à entrada da sua miserável casa, como prova da luz que a tudo observa e inunda. Como ondas.
As areias brancas sopram suavemente um fio de assobio enquanto ela caminha até às águas – enquanto se dirige a Kalunga os seus pés sussurram um sim, renovado, contínuo. Sim sim sim.
O convite. O ágape.
Os seus pés negros brilham porque a sua pele é santa e ungida pelo óleo trazido do outro lado do mar, do Mistério.
Ela sempre entra nas águas quando o sol começa a sua magnífica aurora. Nesses dias ela está feliz, canta sem palavras – e sabe pisar onde os outros não compreendem.
Ela também caminha sobre as águas quando o sol se põe. Mas, nesses crepúsculos o seu rosto fica riscado pelas lágrimas que através dos seus olhos encontram alívio e regresso – retorno à foz – à paz – a Kalunga.
Todas as dores desta terra, todas as injustiças, todos os pecados choram-se-lhe pelos seus olhos.
Ela esvaí da dor os corações de todos aqueles nela pensam. Ela devolve inocência a todos aqueles cujo seu corpo é tecido de dor e medo. Nesse tecido, ela, o fogo renova e purifica.
Ela é fogo sobre as águas.
E hoje as águas diamante da Baía Azul estão totalmente como tu as amas quando com elas sonhas. Tal como sonhas com o calor, e o sol, e o corpo nu que entra no mar quente e salgado.
Ela é linda e o seu corpo nu é manifestação, reflexo e sombra – síntese em gota de cacimbo – de toda a harmonia que o Amor, Deus, pode mostrar aos olhos de um homem que procura ver a Beleza. O Eterno.
Kalunga.
Estou com os meus pés roçando a orla-em-textura destas águas acariciantes. A ondulação sob as palmas dos meus pés – o mar todo em meu redor – também eu me sinto a viajar sobre ti até ao sem-fim.
Experimenta.
Vem até nós, aqui, nesta praia. Entra nu nas águas e vê atentamente a sua superfície. Vê como as suas ondulações são também tocadas pela sola dos teus pés.
As mínimas variações da ondulação em redor dos teus tornozelos espelham os toques da brisa da manhã no teu tronco despido.
Estás com o Mar todo em teu olhar.
Com sorte viverás o milagre. Com sorte andarás mesmo sobre as águas.
Miguel Gullander
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