sábado, maio 21, 2005

Pela densidade folhuda do parreiral





A ramada suspensa em esteios de pedra formava o enfolhado docel do tanque.

Pendiam já dourados os enormes cachos de ferral.

Alguma folha escarlate, outra amarelecida pelo queimar do sol, realçavam, variegando as cores, a abóbada afestoada.

Nos rebordos da bica rústica por onde a água derivava, grogolejando nas algas, verdejavam vegetações filamentosas pendentes como meadas de esmeraldas, e miniaturas de relvedos, onde os insectos se pousavam n'um ruflar deleitoso de asas, no regalo da frescura, oscilando as antenas.

Duas galinhas com as suas ninhadas esgaravatavam na leiva húmida, a cacarejarem a cada grânulo ou insecto que bicavam, e deixavam cair e retomavam de novo, com umas negaças, para ensinar os pintainhos que se disputavam a posse do cibato em corrimaças impetuosas azoratadas.

De vez em quando, à tona d'água, rente com o combro de cantaria afofado de musgos verdes, emergia a cabeça glauca de uma rã que pinchava para a alfombra, coaxava o seu diálogo interrompido com outra rã do beiral fronteiro, e ambas a um tempo, mergulhavam de pincho, quando Cacilda batia a roupa na pedra esconsa do lavadouro.

Estava o sol a pino; mas pela densidade folhuda do parreiral apenas coavam umas lucilações a laminarem tremulamente a água ondulosa e escumada de sabão.



camilo castelo branco
(cacilda)

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