quinta-feira, maio 26, 2005
Um certo acto de tipo espiritual
"O diverso e o inesperado, o antagónico é que são a pedra de toque dum acto de entendimento"
miguel torga
"Creio que, se há um elemento protagonista do que chamamos civilização, é o erotismo.
Porque o erotismo só existe em sociedades que alcançaram um alto nível de civilização.
Quanto mais primitiva uma sociedade, menos erótica ela é.
O amor numa sociedade primitiva está muito próximo da cópula animal, da satisfação do instinto reprodutor, enquanto nas sociedades que chamamos civilizadas o amor foi se enriquecendo, refinando e humanizando graças à imaginação e às formas rituais, a uma certa teatralidade.
O erotismo não está de modo algum subordinado à reprodução, que seria o aspecto utilitário do amor.
O erotismo faz do amor um fim em si mesmo, não um meio para prolongar a espécie.
E justifica o prazer em termos que poderíamos chamar não somente hedonistas, mas também artísticos.
Admiro muito Bataille, mas sua descrição do erotismo sempre me pareceu um pouco lúgubre. Ele elimina do erotismo um aspecto fundamental: o regozijo, o humor, a diversão.
O erotismo expressa a individualidade em estado puro.
Em tudo o mais, talvez, os seres humanos podem ser parecidos.
Na hora de fazer amor, cada um expressa as suas próprias fantasias, a sua experiência mais pessoal, a sua criatividade.
A pornografia é o genérico. É aquela actividade que soterra o erotismo utilizando produtos manufacturados impostos à sociedade por meio da publicidade, quer dizer, por meio de uma forma de alienação colectiva.
Talvez a pior consequência da pornografia seja o facto de que ela desindividualiza o amor.
O erotismo exige um certo padrão estético, um nível de criatividade elevado, uma certa cultura.
Não há erotismo sem cultura. O erotismo é incompatível com a ignorância, com a vida primitiva.
Requer um grau de refinamento elevado e requer, além disso, uma certa espiritualidade investida na ação amorosa.
Não se trata somente de satisfazer uma necessidade física. Trata-se também de realizar um certo acto de tipo espiritual."
mario vargas llosa
pindaro
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